Por que há tão poucas mulheres ocupando cargos nos espaços de poder da cadeia de valor do café?

Talvez não seja necessário dizer que as mulheres trabalham demais, elas são a maioria em algumas profissões, mas ocupam poucos cargos de poder.  No café, assim como no mundo, há muitas vozes e trabalhos femininos dignos de visibilidade.

Neste mês de março é comemorado o dia mundial da mulher, dia político, fruto de lutas por igualdade de direitos, liberdade e emancipação, com origem em meados do Século XIX ao século XX, na Rússia, Europa e Estados Unidos. No Brasil, apenas com a Constituição de 1934 (Código Eleitoral de 1932) foram instituídos o voto feminino e a possibilidade da mulher ser eleita para cargos no executivo e legislativo.

É importante relembrar as origens e os significados desta luta para que ela continue rumo à equidade não apenas de gênero, mas social. A começar pela necessária correção legislativa no que diz respeito à licença maternidade, pois no Brasil o período de licença para a mulher é de 120 dias e para o homem é de 5 dias, fato este que estimula a desigualdade na contratação, já que as empresas preferem contratar homens por este motivo, e mais uma vez é uma forma da sociedade exaltar e ratificar o papel da mulher como responsável por cuidar do filho e do lar.

No mundo do café, essa união e luta das mulheres tem nome: IWCA (Aliança Internacional das Mulheres do Café), que tem por objetivo maior aproximar as mulheres delas mesmas. No Brasil, a IWCA existe desde 2012 “criando oportunidades para as mulheres do café do Brasil”.

Na semana do dia 15 a 19 de março de 2021, a IWCA Brasil em parceria com a ONU Mulheres, promoveu diálogos intitulados “Trilha de Aprendizagem” que contou com tradução simultânea em inglês e espanhol com a seguinte chamada:

“O advento dos cafés especiais deu destaque a novas possibilidades de empreendimentos e profissões no setor de café. Mas como construir um caminho de sucesso em um mercado tão jovem e com tantas possibilidades?”

Mulheres das mais diversas áreas de negócios da cadeia de valor do café, desde a produção à hospitalidade e serviços, passando por torra, comercialização, exportação, foram convidadas a falar com outras mulheres para compartilhamento de informações e sobre como podem se desenvolver profissionalmente. Enfim, uma verdadeira jornada e troca de conhecimento. Todos os debates foram abertos a perguntas, e todo mundo saiu ganhando, como prega o programa Ganha-Ganha da ONU Mulheres que apoiou o evento.

Com a Trilha de Aprendizagem pôde-se perceber que há muitas histórias a serem contadas pelas mulheres, e que entender os caminhos que levaram cada uma delas a ocuparem lugares antes inimagináveis – não sem resistência – , é mais que aprender fatores técnicos e intelectuais, é sentir na alma que as mulheres do café não estão sozinhas, e que há muitos espaços que elas podem e devem ocupar.

Importante ressaltar que, muito se andou na luta da mulher por lugares de direito, porém o universo do café ainda é hegemonicamente masculino. Vê-se muitas mulheres nas primeiras etapas da cadeia produtiva do café, conhecido como “porteira pra dentro”, no entanto, as etapas seguintes, de comercialização “porteira pra fora” há escassez de voz e atuação feminina. (The Way Forward: Accelerating Gender Equity in Co­ffee Value Chains, 2015).

Sororidade é um conceito essencial no movimento feminista, mas a essência da palavra nada mais é que a união entre as mulheres. E este evento promovido pela IWCA é um exemplo de aliança, de solidariedade, e além de todas essas causas maiores, as principais são incentivar as mulheres a se profissionalizarem, conhecerem o seu produto, e dizer mais uma vez que: “o lugar da mulher é onde ela quiser.”

Das vitórias dessas caminhadas e lutas todas, aqui vai uma: Dona Ivone Botoni Baziolli, que trabalhou 65 anos no IAC (Instituto Agronômico de Campinas) e contribuiu muito com a pesquisa de novas variedades de café no Instituto de Pesquisa em café mais antigo do mundo. Ela foi homenageada em evento internacional coordenado pela COFFEE COALITION FOR RACIAL EQUITY. (@coffeeforequity)

Por fim, sob a ótica do conceito Foucaultiano, o poder em si não existe, mas sim relações de poder que estão disseminadas no tecido social de forma muito bem articuladas. Tal articulação chegou a um lugar em que a mulher que antes não tinha nenhuma voz, agora tem um pouco, mas continua em posição de desigualdade numa sociedade que exalta a sua tripla jornada e impõe limites de espaços de poder de uma forma velada.

Conclui-se que ocupar espaços de poder no café é urgente, é necessário!